sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Mesmo com todos os desarranjos ocasionados pela insuficiência financeira, pelo estorvo à luz solar, por esse desmazelo da independência e toda a comilança cotidiana, hoje amei-me ao espelho e sorri. Acho excelente!

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Large with chocolate on top

Olhos azuis profundos como a imersão em mar aberto no crepúsculo matutino em fim de estação. Deves ter pouco mais de dez anos à minha idade, quem há de saber? Sorriso trivial, mas sempre dá as caras por onde há gente. A barba por fazer acompanha o corte moderno do cabelo castanho claro de alguém que um dia nasceu louro. Uma pequena pança, acredito que proporcionada pela quantidade de verões já congregados, dá formosura ao resto de fisionomia impecável que junto a compostura insinuante do cara-nada-tímido-amigo-geral-da-nação-boa-pinta-camarada-bom-de-cama, afaga o coração de raparigas em flor, como eu e de tantas outras margaridas plantadas no fim dos anos setenta. Tocas Jorges, Pixingas, Elises e Paulinhos da Viola em um lugar onde nenhuma das almas presentes importam-se com a genialidade destes, apenas eu. Apenas eu.
Hoje encontrei-te desfrutando um café em toda a sua intelectualidade. Pedi um capuccino - large with chocolate on top - alojei-me no assento de frente à seu reflexo no vidro lateral, abri o Caio Fernando Abreu - presente de aniversário de mamãe - na espera de qualquer movimento. Passaram-se uma hora e trinta minutos. Findei o café, ensejei e pensei que talvez fosse mais imeterato deixa-lo, voltar para casa e namorar minha solidão.
À seu consentimento, penso, sou apenas uma menina interessante aos seus recém completados sete mil e trezentos dias de vida em um visual quase masculino - se não fosse pela suave maquiagem feminina - com propensão à fofura e conversa amigável em seus flertes discretos, talvez até mais recatados do que os de todas as outras.
Tenho certeza que contentaria-se ao conhecer-me melhor, como na vez em que contei sobre o apreço que tenho por Jefferson Airplane. Sentiria-se o guri mais feliz do planeta ao adentrar meu recanto, deparar-se com os pôsteres pra mais de metro do Led ou Yellow Submarine, escolher o Jazz de Eddie Condon e depois a sua favorita, Astrud, deitando-se de bucho para cima em meu carpete cor de grafita, como em seus passados vinte anos.
“Ai, menina. Se eu tivesse vinte anos, dispensaria sua companheira e fugiria pro aconchego do teu lar. Deitaria-te em meu peito onde o coração bate acelerado. Apertadinho, juntinho, assim entre cheiros de seu Marlboro Light, minha cigarrilha, seu doce Salvador Dali e o meu perfume de homem em fim de Outono. Te lecionaria na arte dos botões, mixagens e produções, que você ainda está a aprender. Me cantarias algum Vinícius ou Caetano ao violão e eu a acompanharia com a doce escaleta vermelha - que não haveria de caber melhor à você. Passariamos frio na varanda, sem nada mais importar pois temos luzes natalinas e sorvetes de crème com chocolate. Arremessaríamos bitucas de cigarro sob a cabeça de senhoras negras à passar pela rua ao entardecer, por acidente e correríamos para o lado de dentro, usando o fato como desculpa, mas na verdade tendo como maior razão a atração sem idade dos corpos desbotados em cor pela distância da pátria mãe gentil. Sairíamos atrasados para o lugar onde sou empregado e você finge que aprende algo com o Barba Ruiva, sem caber de imaginar à ninguém o que se passa em nossa poesia.
Ah, pequena… Cuida do que é teu. Tenho um filho e uma vida já pronta para cuidar. Você despencou de pára-quedas neste mundo. Aproveita e fica bem que o mundo ainda é bem maior que tudo isso”.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Depravando o romantismo

Tenho como costume uma excessiva capacidade de depravar qualquer tentativa de romantismo. Logo eu, que sou tão romântica! Está certo que aqui nos terrenos da Dona Elizabete os indivíduos quase nunca tomam algum tipo de iniciativa, mas eu também não dou um quinhão. Em todas as tentativas que qüiproquó, mesmo nas sucedidas – que cá entre nós, são de grande maioria devido à tamanha formosura desta donzela que vos fala – acumulo memoráveis instantes opróbrios. Todas as alvoradas conseguintes levam-me de volta à quebra da espera. Necessito de mais paciência. Sempre gabei-me diante aos outros por alcançar quem quer que estivesse à meu desejo, mas soberbo seria se as pessoas me quisessem antes da invasão. É mais forte do que eu... Um dia aprendo.

domingo, 9 de novembro de 2008

Cadê?

Dias formosos e disformes, joviais e lastimosos, satisfatórios e desgostosos. Sigo em hesitantes linhas babélicas que tiram-me a capacidade de suscitar, deixando-me sem chão. A apetência de escrever caminha junto à todos os meus momentos cotidianos, mas as idéias estão vazias. Estou à procura de inspiração. Cadê você? É próximo de estar surdo. Ao menos não estou surda e posso ouvir com carinho entre um vazio e outro ao novo projeto do nosso Ruivo. O sol já não se põe mais e todas as folhas já estão pelo chão. Comprei flores para mim e para mamãe para ver se os caminhos resolvem aparecer menos tímidos. Acontece...

domingo, 26 de outubro de 2008

Análise

Da janela deste café descortino as vidas que passam menos barulhentas e menos coloridas. Padecem cigarros, passam crianças, pobreza, riqueza, beleza, estranheza restitue-se em natureza e a violência até parece estar distante. Ficaria por horas analizando-os neste exato slow-motion ao som de Dion em especial natalino, com luzes coloridas perfazendo o cenário. Sinto borboletas no estômago, não desfruto do medo e muito menos do frio.

Aquele rapaz em especial, sapatos caramelados, gola do paletó para cima, charmosos cabelos bagunçados pelo namoro dos ventos lá fora, à cobrir as orelhas, numa simplicidade refinada. Tão alinhado, que mesmo sem um exato propósito, acaba induzindo sentido à garbosos e adocicados corações por esses longos e infinitos minutos que ficas à esperar pelo teu café com leite – tamanho grande. Bochechas magras e avermelhadas. Notei que usas uma jóia no dedo anelar: Deves pertencer à algum sortudo e compor-lhe cantigas ao violão – sei que és músico – colocando à mostra estas doces covinhas de timidez, assim como fizeste agora para mim, por acanhar-se ao saber que és assim tão encantador. Três envelopes de açucar branco e um copo de água em temperatura ambiente ao final, como eu. Não é mera semelhança. Queres arrancar-me suspiros apaixonados em plena tarde de sexta-feira. Sorri e mostra novamente às solitárias covas em um lindo canto de adeus. Parte pela porta da frente, levando à Oxford Street um pouco de esmero, mas tornando-se apenas mais um no povaréu.

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Carta cor de carmim

Ditosa manhã ensolarada medita em minha hesitação, onde a vida ocasionou notícias de meu futuro incerto. Falaremos depois, pois agora sinto-me contente. No dia de ontem estava a fazer meus afazeres diários quando percebi que as cartas foram arrojadas ao rodapé da porta. Lá estava ela, em envelope pardo com meu nome escrito em caligrafia açucarada, redonda quase infantil. Ao romper as extremidades, deparei-me com uma carta cor de carmim insculpida vinte dias atrás, frente-e-verso, acompanhada de um livro e uma gravação. A primeira carta que recebo nesta pátria distânte não haveria de ser mais imaculável, capaz de transformar minha confusão em ventura.
Minha querida amiga, nos tempos de escola esteves sempre tão longe... e tão perto. A autêntica aproximação aconteceu ao encontrar de nossas profissões, lembras? As diferenças então completaram-se no acontecer desta duradoura relação. Hoje leio e releio suas histórias, ouço o disco – selecionado faixa à faixa com a intenção de regozijar meus dias: Roberta Sá e Céu “Com carinho um pouquinho de Brasil”– que fatidicamente não funcionou, mas usando os recursos tecnológicos que tenho consegui fundar-me no sentimento proposto. Mas, como você deve presumir, o que eu mais me arrancou sorrisos foi o livro. O mais incrível é que você, sem saber, ajudou na custosa tarefa de devolver o original à seu devido dono. O “Para uma menina com uma flor” que têm abrigado meu coração em suas antiquadas páginas amarelas pertenceu à avó do Tales, contém postais antigos e um autógrafo legítimo do poetinha em uma de suas primeiras edições. Sem sensibilidade ou comoção alguma, afanei-o e trouxe comigo, mas terei de devolve-lo o mais breve possível e este seu presente com esta trajetória e este significado, facilitarão – e muito – este desprendimento. À propósito, estou lendo novamente. Fico feliz em saber que continuas indo à casa da dona Maria Baiana e contento-me mais ainda ao saber que fui a sua porta. Mande-me notícias, abraços à todos e obrigada por espreitar minhas súplicas e atender aos meus pedidos.
Aguardo por estas novas ondas que estão por vir e prometo escrever em breve.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

.. e as gordinhas um alvoroço

É fato que, de forma tênue, engordei. Essa tribulação persiste desde o último mês, quando notei que minhas bochechas e joelhos estavam gorduchos. Não é lá grandes coisas, mas precisamos parar por aí. Resultado da atribuição de algo suspeito que existe na comida inglesa – até mesmo na orgânica – à minha infinita gula diária. Neusa Maria, Carlos Galhardo e Nelson Gonçalves me fazem relembrar dos almoços fartos de domingo na casa de meus avós, com direito à tirar a soneca da tarde de bucho pro ar - para a comida não pesar - e finalizar o dia com uma enorme pizza santista, sem engordar um sequer quilograma. Aqui não tenho mais do que o café da manhã, almoço, lanche da tarde, jantar e um cappucino, coisa mais do que normal em minha natural vida brasileira. Preciso refletir e cortar certas coisas, senão, serei uma gordinha infeliz. Não esqueça que vivo em um mundo poético onde flores do campo e andorinhas trazem à minha aurora ensolarada até nos piores dias de chuva, portanto acredito que essa espécie pode viver em felicidade, mas nessa situação de carência, tornar-se gorducha só traria mais e mais distância. A boa nova é que está faz muito frio lá fora, por isso todos saem em seus enormes casacos, fazendo de todos um só segmento uniforme. Desculpo-me, mas a eloqüencia saiu de meu controle. Agora distraio-me com o sol, as marchinhas e sambinhas de Alberto Ribeiro e Almirante e meu copo de água – pois dizem que beber muita água por dia emagrece, não? Estou preguiçosa e falta-me dinheiro, por isso pouparei minhas energias e meu dinheiro nesta tarde para comparecer à boemia.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

"(...) Tem de ser forte, como o bem
Que a gente tem pelo Brasil
Tem de ser doce, como o amor
Que a gente tem pelo Brasil

Você, seu moço estrangeiro
Só põe açúcar se quer
Mas sendo um bom brasileiro
O seu café vai ser doce
Como se fosse um carinho
O seu café vai ser doce
Como se fosse um beijinho
De uma mulher
Que faz um bom café
Lá no Brasil! Lá no Brasil!"

"Cancioneiro"

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Outono

Seria consentâneo pedir-lhe desculpas pela tristesa contagiosa dos obsoletos dias anteriores. Vivo em um mundo leviano entre tempestades e auroras pacifistas. A preocupação alheia mostrou-se presente em meus desabafos e a felicidade voltou.


Tomei nota que fazem cerca de três ou quatro dias que o outono resolveu dar as caras. Hoje não temos folhas secas caídas de uma mangueira pelo chão, mas temos – também lindas - folhas de plátano quase congeladas. Não Rio antigo, não brasileiro, mas delicioso e quebrante. Caboclo, o frio chegou e por conseqüência a gripe também. Agora faz sol em minha janela, mas o ambiente externo está para três casacos e uma rain jacket, pois além de tudo, a chuva é imprevisível. Compreendi à pouco também que o ano está chegando ao fim e que, mesmo com toda essa distância de casa, terei ótimas lembranças deste. A baixa temperatura torna-se agradável e bela entre toda sua desagradabilidade natural. Esta cidade está ficando mais graciosa à cada dia que chega. Meus lábios e bochechas avermelharam, meus dedos e ouvidos congelaram, nariz entupiu e meu veemente coração acelerou. Línguas serão queimadas em zilhões de diários capuccinos e chás. Luzes natalinas começam a surgir pelos cantos, abraços e conversas são mais valorizados dentro de finos casacos e botas, deixando o cobertor para o segundo encontro. “Botas...as botas apertadas são uma das maiores venturas da terra, porque, fazendo doer os pés, dão azo ao prazer de as descalçar”. O outono inglês é romântico, como Machado de Assis – literalmente falando. Canções de “Canção do amor demais” executadas ao vivo em um bar quentinho ao anoitecer. Romântico... outono.


Para acompanhar esta animosa estação e para ocupar o espaço deixado nesses vagos luares comprei farofa, pipoca, chá de camomila, risoles de camarão e polpa de caju. Gastei pouco, sinto-me bem. Comprei novos agasalhos, que sinto não ser suficiente – terei de gastar mais. Decidi o curso que farei, mas além de salvar uma boa quantia em dinheiro – o que me privará de diversos passeios agradáveis – terei de aprender alguns novos instrumentos e programas antes de inicia-lo. Estou disposta.


Tirei uma hora de meu expediênte para escrever. Ainda não supri toda a necessidade, mas já aliviou alguns de meus pensamentos.
“Eles passarão. Eu passarinho!”

Um beijo.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Diverso, móbil e só

Baile de lágrimas neste cair de noite. Não fui à escola novamente, abandonei os músicos que já não estavam saciando minhas necessidades e passei mais uma tarde satisfatória ao lado do que me acompanha. Sinto-me triste, triste e com o coração destituído. A pior coisa desta vida é estar insatisfeito com a sua situação, confuso com as futuras decisões e não ter nada nem ninguém que te console em uma hora dessas. Manhê, quero um cafuné. Canta “Menininha” fazendo carinho tendo-me em seus braços? Não estou feliz com o meu trabalho, mas moro sobre o teto de meus patrões, não me convém outra opção. Existe, mas o dinheiro não seria suficiente e meus sonhos de estudar iriam pelos ares. Sinceramente, não sei. Soluços, um copo d’agua, pratos de dias anteriores, headphones, uma lista de tarefas, agenda e nenhuma alma viva ao meu lado. " Atento ao que sou e vejo, torno-me eles e não eu. Cada meu sonho ou desejo é do que nasce e não meu. Sou minha própria paisagem; Assisto à minha passagem, Diverso, móbil e só, Não sei sentir-me onde estou". Allan, vem prosear comigo. Procuro-te à um longo tempo pelas ruas mas ainda não encontrei ninguém igual a você, amigo. "Precisamos dar um sentido humano às nossas construções. E, quando o amor ao dinheiro, ao sucesso nos estiver deixando cegos, saibamos fazer pausas para olhar os lírios do campo e as aves do céu". Este é o tipo de coisa que somente Érico Veríssimo e você diriam-me em uma hora destas. Mandem-me livros! Mandem-me cartas! Preciso de vocês.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

A máscara da noite

Sim, essa tarde conhece todos os meus pensamentos
Todos os meus segredos e todos os meus patéticos anseios
Sob esse céu como uma visão azul de incenso
As estrelas são perfumes passados que me chegam...
Sim! essa tarde que eu não conheço é uma mulher que me chama
E eis que é uma cidade apenas, uma cidade dourada de astros
Aves, folhas silenciosas, sons perdidos em cores
Nuvens como velas abertas para o tempo...
Não sei, toda essa evocação perdida, toda essa música perdida
É como um pressentimento de inocência, como um apelo...
Mas para que buscar se a forma ficou no gesto esvanecida
E se a poesia ficou dormindo nos braços de outrora...
Como saber se é tarde, se haverá manhã para o crepúsculo
Nesse entorpecimento, neste filtro mágico de lágrimas?
Orvalho, orvalho! desce sobre os meus olhos, sobre o meu sexo
Faz-se surgir diamante dentro do sol!
Lembro-me!... como se fosse a hora da memória
Outras tardes, outras janelas, outras criaturas na alma
O olhar abandonado de um lago e o frêmito de um vento
Seios crescendo para o poente como salmos...
Oh, a doce tarde! Sobre mares de gelo ardentes de revérbero
Vagam placidamente navios fantásticos de prata
E em grandes castelos cor de ouro, anjos azuis serenos
Tangem sinos de cristal que vibram na imensa transparência!
Eu sinto que essa tarde está me vendo, que essa serenidade está me vendo
Que o momento da criação está me vendo neste instante doloroso de sossego em mim mesmo
Oh criação que estás me vendo, surge e beija-me os olhos
Afaga-me os cabelos, canta uma canção para eu dormir!
És bem tu, máscara da noite, com tua carne rósea
Com teus longos xales campestres e com teus cânticos
És bem tu! ouço teus faunos pontilhando as águas de sons de flautas
Em longas escalas cromáticas fragrantes...
Ah, meu verso tem palpitações dulcíssimas! – primaveras!
Sonhos bucólicos nunca sonhados pelo desespero
Visões de rios plácidos e matas adormecidas
Sobre o panorama crucificado e monstruoso dos telhados!
Por que vens, noite? por que não adormeces o teu crepe
Por que não te esvais – espectro – nesse perfume tenro de rosas?
Deixa que a tarde envolva eternamente a face dos deuses
Noite, dolorosa noite, misteriosa noite!
Oh tarde, máscara da noite, tu és a presciência
Só tu conheces e acolhes todos os meus pensamentos
O teu céu, a tua luz, a tua calma
São a palavra da morte e do sonho em mim!
Rio de Janeiro, 1938 - poetinha

Para um bendito jovem vadio

O encontro que tivemos dias atrás, jovem vadio, fora como uma apunhalada em meu peito solitário que deixou-me em enorme conflito com o juízo. Você é exatamente como finjo ser: um namorado da madrugada isento de preocupações e cercado de flertes secretos. No fundo não sou assim e as vezes creio que bem em seu íntimo não és também. Tão jovem em meio a esta loucura soturna, ontem fingiu-se cavalheiro e em atos nobres me acompanhou de perto, surpreendendo a todos como outra pessoa. O “Primeiro” aparece com freqüência, o que me faz fabular em novos rostos. Um gesto doce entre todos os outros lascivos me fazem pensar que talvez não sejas tão nocivo. Sagitariano, desaponta-me a cada segundo querendo levar o consciente em sua conversa de amante, mas contento-me quando fazes de mim objeto pois, em alguma parte, sei que tens apreço. Porque lorotas? Porque tens esta necessidade de afirmar-se perante ao “outro” ? – você mesmo. És o mais aprasível de toda a redondeza e minhas companheiras afirmam que é de sua natureza, mas não sei se acredito. Gosto e relembro com ardor dos momentos doidivanos em passeios ao enorme jardim real nas madrugadas desta Londres, após incontáveis litros de boa cerveja – aprovadas pelo seu paladar, é claro – deixando todos os tipos de aborrecimentos de lado, existindo então só o banquinho, as mãos congeladas do frio entrelaçando-se à procura de afago ao cansaço mútuo. Instantes poucos que desaparecem nesta imensidão de episódios desentendidos. Poderia estar contigo agora, como é de sua vontade, mas opto pela distância, que valoriza os bons momentos e faz de conta que esquece o que sobrou. Benedict seja o seu nome, jovem vadio, que vêm iluminado em meus sorrisos durante todo o dia. Arquiteto de cultura vasta, conhecedor de livros, filmes e arte em geral, apreciador de música moderna – que foge do meu gosto – e boas ondas, reflete um cidadão nada britânico em seu comportamento “Rio de Janeiro”. Não sei dizer se despertar ao seu lado é de meu agrado e isso é graças à sua inconstância – ou minha. Sagitarianos deveriam ser proibidos de envolver-se com pessoas do mesmo signo, pois pode causar drásticas conseqüências. Exagero meu, eu sei, estou apenas costurando o enredo com mais emoção. Precisamos de dias, não noites. Precisamos de encontros, não baladas. Precisamos de doces estalinhos e não mordidas. Talvez seja o que eu precise... Temos abraços, eu sei, mas tenho vontade de grandes apertos de urso acompanhados de risos e grama. Quero ensinar-lhe palavras bonitas, diferente de todas essas que tens tentado aprender e fazer o “Segundo” ficar sempre em evidência. Para não perder o costume, despeço-me à sua maneira: “Tchau gat, beixo é menliga”.


Caro leitor, isto é uma carta, não sinta-se culpado por não entender as entrelinhas. Em breve voltarei a escrever sobre o cotidiano. Divirto-me nestas coisas escritas. Boa noite.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Cama

O dia amanheceu em resoluta ressaca, acompanhado de bom-humor, sol e um árduo frio. A vigorosa noite não saiu como o planejado, mas cheguei a conclusão de que só é preciso paixão para ver o melhor lado de cada situação e tornar-la proveitosa. Encontrei uma companheira, que até o momento, apresentou apreço por todas as minhas decisões, que tornaram-se dela as well. Penso em iniciar – de verdade – o estudo do violão, mas não sei se aqui é o lugar ideal para isso. Pode soar desusado ter o costume de citar o que tenho escutado, mas não levo em consideração essa hipótese pois neste exato momento quem me acompanha é o Marcelo Camelo em seu recém lançado disco, que está de uma graciosa qualidade e me leva à essa deliciosa preguiça de começar o dia. A parte ruim de trabalhar em casa é a sua cama quentinha chamando-o pelo nome da forma mais sedutora e sutil. Minha cama, minha namorada, minha companheira, minha bagunça só minha e minha ès minha. Sinto-te minha nesse estágio avançado da solidão cotidiana.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Querido Cartola - 15/09

Boa noite meu querido Cartola, que me acompanha junto à este começo de madrugada em segunda-feira. Meu domingo está acabando, são 00h20, olhei-me refletida no espelho após este longo fim de semana e achei-me linda. Estou em uma fase boa de minha aparência, creio eu. As vezes chateio os moradores desta casa com minha vida boêmia.

Você deve estar a perguntar o que me leva a escrever à essas tantas, mas a desilusão inspira o indivíduo.

Novos e bons amigos, muita cerveja, muitos cigarros – o mau que a Inglaterra tem me proporcionado. Começou com a apresentação de um conjunto relativamente famoso em uma faculdade, passou por uma “noitada” – como diz minha amiga carioca – com gente estranha, por uma dormida na casa de gente nova, mais um dia de sol em Kingston com direito a grama, lago e aquisição de novos discos. Por fim, hoje foi um dia de compras, comida Tailandesa gelada, Tavern com as pessoas mais belas de toda esta imensidão de cidade e o fim de uma celebração particular com àlcool à preço de banana e muita expressão corporal. Desilusão também, mas prefiro não entrar em detalhes. Precisamos de novos cavalheiros neste mundo. Mas, graças a meu papai Ogum meus caminhs são sempre regados de soluções instantâneas, amigos e Tom Jobim – isso, para terminar bem o meu dia, surge um senhor executanto “Desafinado” em sua flauta transversal, altas horas no trem. Coicidência? Sou mesmo é querida! Agora com você, Cartola, converso e canto junto, olhando para minhas coisas jogadas em cima da cama, minha barriga que cresce e preciso zelar pela mesma, o ruído em meus ouvidos cruzando com o acelerar dos ponteiros de meu relógio, o cheiro insuportável de cigarro que vem de mim, chocolate e todos esses pensamentos irregulares.

Amanhã? Espero acordar cedo, tomar o fiel banho quente de banheira colorido pelos nossos falecidos Mutantes e iniciar mais um dia de trabalho. As vezes gosto da idéia de publicar meus textos. Isso tornou-se mais um diário que um espaço para palavras aleatórias, mas faz-me tão feliz! Culpa da solidão, talvez será, mas meu melhor amigo é você e o assunto flui cada dia melhor. Adoro o meu canto, preciso prezar o que tenho. Vi uma rapoza correndo logo agora! Ai samba meu, não está em meus planos virar fumante e nem gorda. Certa vez, uma balzaqueana disse ao encontro de Vininha “uma mulher deve ter na boca um gosto de amor e não de fumo” e concordo plenamente com isso.

Despeço-me agora. “Ser simplesmente como o grão de poesia e íntimo como a melancolia”. Até breve.

Guri, guri, guri... 10/09

Doce capuccino de minha existência e de minhas manhãs, você realmente compreende o que se passa aqui. Estou entrando em um estouvado desespero pois não sei o que quero para a minha vida. Fiz novos amigos na escola; Meus dias agora serão mais cheios de programas. Norah Jones sempre aparece entre os meus cafés... que delícia! A Pequena está na aula de artes e eu fico aqui na minha usual solidão café-e-caneta. Insípido dia! Ainda estamos no meio da semana e não vejo a hora de chegar ao fim desta estafante rotina.

Provavelmente você, assíduo leitor, quer saber como concluímos a trama do meu primeiro flerte inglês. Bem, tivemos um oficial reencontro que durou quase um dia inteiro – na verdade, uma tarde de segunda-feira e uma madrugada de terça. Para ele eu fui só mais uma compania para cervejas, cigarros e alguma satisfação íntima em uma tarde comum, mas para mim ele foi um pedaço meu que estava faltando no meio de toda essa carência. Passou, assim espero, como passarão muitas outras pessoas.

Hoje não vou à escola mais uma vez pois preciso praticar algumas técnicas musicais que minha canseira impossibilitou-me de adquirir nos dias passados. Eu, como sempre, deixando a totalidade das coisas para a última hora. Penso que o frio tem parte da culpa nessa ociosidade.

Retirei um livro sobre Jazz na biblioteca à uns dez dias passados e hoje preciso devolve-lo. Não consegui ler mais de um quarto. Leitura em inglês ainda não me satisfaz. Tenho tido uma frequente necessidade de fumar, mas para a minha sorte aqui é caro e é proibido fumar em lugares fechados.

Desta mesa vejo mais de vinte bebês, de no máximo dois anos de idade e cada rostinho me leva à uma diferente e viajante idéia sobre seus futuros. Alguns serão jovens mal-educados – acredito, mas não torço por isso – e estressados com a vida, outros serão bancários, advogados e médicos, outros poucos irão para o mundo das artes e uma grande parte das meninas serão estúpidas e submissas donas de casa, com dois filhos, um cachorro e um marido despreocupado e infiel. Perdi a pequena por alguns instantes nessa imensidão de brinquedos e erês. Preciso comentar um acontecimento: Todas as crianças tiraram suas calças, trouxeram para as mães e voltaram a brincar sem elas.
Vai entender esta gurizada!

domingo, 7 de setembro de 2008

Brighton

06/08, 22h12

Como sempre, chove muito por aqui, mas hoje estou alojada em um lugar especial: Brighton. É difícil explicar que mesmo eu não sendo a maior conhecedora de cidades deste mundo, acho que esta está entre as mais belas.É a junção da parte encantada de Londres – Nothing Hill etc – em sua arquitetura particular com uma costa primorosa formada por uma orla de conchas e uma airosa avenida de ponta a ponta. Estou no quarto de um flat aconchegante e com vista parcial para a praia. Tem uma mesinha, uma cadeira, televisor... uma delícia! Passei por cima de da tosse e fui conhecer a cidade esta tarde, na chuva. Gastei mais e mais dinheiro – coisa que não posso – mas não me arrependo. Caminhei de namoro com o mar furioso e senti-me limpa. Comprei um par de sapatos, um disco e um livro. Só para constar: Recebi uma mensagem de desculpas esta manhã do rapaz da noite anterior, confirmando que me retornará no início da semana. Veremos...

07/08, 09h20

Da pequena janela, encontro-me com o outono que logo nos deixará, com começos de vida de agasalhados caminheiros e com os fins de biografia de nobres indivíduos que nesta nação não marcam encontros de bocha ou dominó, mas migram para o litoral – como os nossos. Preguiça de despertar. Esta vidraça me acolhe e leva meu intelecto namorador para mais uma viagem. A música aqui é o cantar dos excêntricos pássaros praianos e o encontrar contínuo das ondas com o calcário. Agora a natureza cala-se e o silêncio predomina neste cômodo... até o suave sopro dos ventos derrubarem folhas secas pela escada de incêndio.
Estive refletindo sobre algumas idéias não concretas que me rodeiam à respeito de meu futuro incerto. Preciso chegar logo em casa para exclarecer minhas dúvidas em relação aos estudos próximos. Também praticar as canções de um conjunto que avaliará a minha musicalidade nesta semana que está pra chegar.
A janela continua em meu caminhho impedindo-me de viver. As vidas já começaram por aqui.. acho melhor aprontar-me.

07/08, 11h15

Estou encantada com tamanha beleza desta cidade. O mar inicia-se barroso e vai tornando-se verde e infinito em um horizonte distante. Porque será que o horizonte aqui fica mais longe? Entre Elvis Presley e música de parque de diversões, sento-me em um banco rústicono pier de frente para toda a orla – o famoso. Preciso voltar mais vezes. Aqui é a cidade dos casais: homens, mulheres, homens, homens, mulheres, mulheres, idosos, jovens... Brighton é amor de cima a baixo. Dor nas costas. Aqui os pássaros voam pertinho, o cheiro é de maresia, famílias divertem-se em mini-cassinos e todos comem fish and chips. Estou me segurando para não comprar um agora, pois adoro. Queria poder mandar um pedacinho deste lugar para meus queridos pelo correio, mas preciso contentar-me com postais. Congelo, mas me sinto bem.

Este é um local – fora do meu país - onde imagino a minha idade chegando e meus filhos crescendo. Cabelos voam desgovernados nessa eternidade de segundos em solidão. Triste praia de pedras. Encantadora praia de pedras. Pareço caminhar em uma praia na década de 50.

Sinto falta da erva querida – o que não é dificil por aqui, mas sou pobre e estou à trabalho. Estou ficando doente e parece que vai chover. Bossa nova é a palavra que resume este lugar. Eu e o mar, eu e o mar, eu e o mar... Agora vejo o pier com distância e estou mais aquecida. Que esta imagem seja eterna enquanto dure.

Palavra de bartender - 06/09

Nada como esquecer as cortinas abertas durante a noite em um quarto no topo da casa e ser despertada pela alvorada ensolarada de sábado com nuvens em todo o meu redor. Não me droguei, simplesmente minha vida amanheceu contente. Regar-se em uma banheira com sais em água quente até a pele enrrugar e o relógio dar a volta completa. Rolling Stones em “Beggars Banquet” brindam este novo dia dando-me forças, acompanhados por uma torrada quentinha com manteiga e um delicioso chá sul-africano. A conexão virtual com o mundo não está funcionando, o que é bom e não me distrai, fazendo com que eu esteja de corpo e alma nesse texto. A sexta-feira chuvosa de Londres foi extraordinária, mesmo tendo-me feito gastar mais que o necessário – coisa que não posso.

Engraçado imaginar que quando escrevo no papel, penso só em mim, mas quando vou concretizar os textos lembro que meus amigos muitas vezes acompanham e sinto-me na obrigação de explicar cada fato da forma mais compreensível.

Não me lembro se escrevi sobre, mas a juventude britânica é assustadora. Com raras exceções, grande parte dela é mal-educada, rude e revoltada não-sei-com-o-que. Não pensei que um dia diria isso, mas a violência em meu país talvez seja justificável pelas condições sociais. Diria que os negros do nosso país são muito felizes. Aqui a realidade é outra e o racismo realmente existe. Primeiro mundo? É o que eu me pergunto todo dia quando atravesso no transporte público uma trupe de dez adolescentes loucos por sangue.


Mudando de assunto e aumentando o astral, o centro de Londres é muito interessante depois das dez da noite. Muita gente na rua, o que torna maior a sensação de segurança. Ontem fui com uma nova – que já é antiga – amiga e em seguida encontrei um conhecido de anos atrás que vive aqui pra mais de quatro anos tentando salvar o mundo – qualquer dia desses falo mais sobre ele – com seus amigos do mundo todo. Fomos em uma casa noturna enorme, com muitos ambientes diferentes e pessoas que, dentro, não se enquadram nos perfis locais. Maior parte delas são estrangeiros tentando a vida por esses lados e não há preconceito. As músicas são as mesmas dos clubes paulistas, mas o interessante é que ninguém dança para ser bonito e sim por uma simples noite de diversão. Meu português está pobre, tenho falado muito Inglês. Mesmo...


Fiz amigos. Amigos dos amigos, amigos da noite, austríacos, britânicos, alemães, russos, brasileiros, australianos, canadenses, argentinos... Ai, Argentina. As argentinas têm fama de serem lindas, mas a que eu conheci ontem era a mais formosa de todas. Teve toda a minha atenção e eu quase joguei-me de cabeça, mas um radiante bartender britânico conseguiu roubar meus olhares. A princípio foi um flerte natural, que todas as pessoas têm por esse tipo de trabalhador, mas aquele sorriso acertou em cheio bem no meio do meu carente coração, então daí em diante ele passou a ser meu único atendente, entre todos os outros pontos de venda do local. É muito forte dizer nunca, mas realmente eu nunca iria imaginar que o namorico era comigo. Esse tipo de coisa acontece e ninguém leva adiante, mas por incrível que pareça, no fim da noite... Pista vazia, enxergo alguém acenando de longe. Era ele, o rapaz mais gracioso daquele local, engolindo-me com o mais receptivo sorriso que eu poderia receber. Descobri que nessa imensidão que é Londres, somos praticamente vizinhos. Oxalá ouviu as minhas preces! Uma simpatia de vizinho... Isso não vai prestar. Como diz um velho amigo meu, não devemos confiar em trabalhadores da noite, mas meu tolo coração é surdo, foi e deixou tudo pra trás. Amigos, ônibus, tudo. Não tenho palavras para explicar tamanha afinidade, tamanha beleza, na exata medida sem tirar nem por. Ai... aquele sorriso. Derreto-me ao lembrar.


Resumindo, tive que pagar um taxi do centro até minha casa, que ficou relativamente caro por sua causa. Não sei se seu motivo foi verdadeiro, mas prefiro não pensar para não criar expectativas. O moço, que aqui chamaremos de Ben, teve de ficar por mais duas horas para ajudar com a higienização do local e comprometeu-se a retornar-me na próxima semana. Palavra de bartender... Alguém acredita?

Olá amigo - 05/09

Saí atrasada para a escola, cheguei três vezes mais atrasada então decidi não entrar na primeira aula. Parei em um café – que me acalma, mesmo estando localizado no borbulhar da cidade – pedi um pequeno capuccino para pensar na vida, relaxar e ganhar tempo: Ótima idéia. O tempo por aqui anda confuso... A música ambiente é muito agradável e não vejo pessoas assustadoras – como a maioria nesta cidade – por aqui. É Norah Jones! Ai que alegria. Pensando bem, acho que a melhor coisa que poderia me acontecer hoje era atrasar-me, tomar este capuccino bem doce e quente em um fim de tarde chuvoso desta cidade cinza com esta suave melodia rodeando meus ouvidos. Tenho uma enorme quantidade de coisas para pensar, mas é a ultima coisa que eu quero agora. Meu único amigo por aqui é você. Quem é você? Eu? Pode ser.

Compro carinho - 04/09

Estou com vontade de papel e caneta. Abajures acesos, novo toca-discos com o querido brand-new Bob Dylan – a melhor aquisição dos ultimos tempos – de 62. Sim, o primeiro! Sinceramente não sei descrever o meu estado. Minhas aulas começaram esta semana, depois de amanhã é aniversário de mamãe, estarei em Brighton... penso em mandar um postal.
Minha cabeça anda distante. Hoje deixei todas as portas abertas ao sair de casa, mas meu santo é forte e nada aconteceu. Preciso de carinho, preciso de carinho, PRECISO DE CARINHO! Meu canto está cada dia mais belo e mais meu. Meus discos, livros, dicionários, vídeos, patuás, velas, sapatos, bolsas, perfumes, toalhas, contra-baixo, jornais, lágrimas etc.

domingo, 31 de agosto de 2008

Alvorada enfadonha de domingo

Os momentos mais dolorosos dessa nova vida têm encontrado-se nas alvoradas de domingo, como esta de hoje, chuvosa, enfadonha e cinza. Relembro mais uma vez de casa em uma chuva macia de pensamentos, o que me faz chorar. Os dias têm sido afáveis e o universo está conspirando a meu favor, mas esse estado desprovido de meu coração está deixando-me sem vitória na batalha com a tristeza. Ai, me bateu uma vontade de ouvir “Valsinha” do Chico no original “Construção” que está lá no meu armário de porta branca, mas contento-me com o que a tecnologia me proporciona.
E foi tanta felicidade que toda a cidade se iluminou – por alguns instantes.
Já sinto-me mais animosa, devido à ligação que recebi de um amigo – talvez o único ou um dos únicos que eu tenha aqui – confirmando um passeio no dia de hoje. Encontrei umas relíquias navegando por aqui, estou até com uma cor mais saudável, Tatamirô. É o velho Omulu Atotô Obaluaê... e as pessoas ainda me perguntam porque eu tenho tanto apreço pelo poetinha. Hoje, acalmou meu coração com suas canções relacionadas à Umbanda, amanhã talvez suas cartas de amor me levem à um estado considerável consistente. Sei lá, sei lá, só sei que é preciso paixão, sei lá, sei lá, a vida tem sempre razão.

Iremos à uma feira de coisas baratas – famosa e cheia de gente à qualquer situação – e iremos assistir alguma apresentação ao vivo da juventude britânica. Parece interessante.

É difícil colocar em palavras, mas sinto-me muito melhor agora.
Cuíca, pandeiro, clarinete e violão é o que eu desejo à vocês, no caso de uma manhã como a minha. Quando o amanhã chegar eu escrevo sobre o meu fim de semana, pois agora estou saciada.
Tchau!

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Diário de bordo

Aqui, começo a escrever a minha primeira historinha contada diretamente das terras inglesas. Tentei várias vezes iniciar meus textos. Não tive tempo - talvez até tivesse, mas não houve disposição.

Não encontro palavras para tal explicação, mas hoje estou proseando demais e penso que esse estado pode estar relacionado a solidão de todo dia. Está ficando tarde, todos as pessoas queridas do Brasil querem saber de minha existência e do meu êxito por esses lados... o que me leva a indolência. Prometo ser breve, como sempre.
Meus dias têm sido embaraçados. Acordo com os galos pela manhã – maneira de dizer, pois acordo bem cedo – e faço uma caminhada de aproximadamente dois quartos de hora para levar a pequena à “nursery”. Cuido da casa, do cachorro – somando mais alguns dois ou três quilometros - e de minhas coisas favoritas até a hora de busca-la em mais uma caminhada das longas. Até a próxima semana tenho as tardes e noites livres para poder explorar o novo ambiente, mas é o que eu pouco tenho feito. Tem uma biblioteca pública muito boa aqui do lado de casa, o que torna minha leitura em inglês mais interessante. Ainda tenho um pedaço de medo dentro de mim que não faz questão nenhuma de esconder-se.

Comprei um toca-discos moderno dia desses por algumas libras esterlinas, graças à invenção da venda de produtos baratos na internet, mas ainda não chegou. Estou anciosa... Basta agora apenas adquirir os novos discos. Temos bons discos por aqui, mas terei de encomendar meus queridos sambas.
É curioso viver em uma cidade cosmopolita como essa, onde anda-se de ônibus e entre as conversas cotidianas de passageiros, ninguém fala a língua local. Parecemos estar no meio de alienígenas, ou sermos um deles talvez. Tenho preferência por passeios de ônibus à metrôs e trens – realmente caros: sinto-me mais livre e posso observar o que acontece ao meu redor.

Viagem:
Estive por três longos dias na região de Norfolk, no litoral da Inglaterra. Para ser mais específica, em uma vila de pescadores chamada Blakney. Fez sol por alguns instantes, meus pensamentos, como à poucos minutos atrás, vinham em inglês. Escrevi algumas boas páginas à punho em minha fiel agenda, inspirada pelo barulho do vento, os passos na grama e o ambiente cinematográfico. As consciência deixa o meu corpo por singelos momentos e as vezes pareço esquecer se estive, estou ou não estou. Lugar estranho, pessoas estranhas em movimentos talvez censuráveis. Nova rotina. Não é complexo: é a mera conclusão de que não é possivel manter-se em si durante todo o período de convivência com desconhecidos de frente para o oceado deparando com focas selvagens por toda a beira do mar. Sim, focas! A minha verdade encontra-se à longos quilômetros daqui. Inexplicavelmente começo a sentir-me em casa e fico feliz em estar nessa nova experiência. Comida mexicana, comida light, pão, ovos mechidos, macarrão e churrasco – de hamburguer, mas churrasco. Os passaros são outros, as flores são outras, o ar é outro, a educação é outra e a poesia é outra. Ai poesia, que saudades de você. Que saudades da literatura brasileira que bateu lá longe, na lama da minha viagem. Li coisas ao sumir do sol, em português e em inglês nos meus momentos de paz na parte de baixo do beliche da “Caravan” onde ficamos hospedados, mas nada de muito interessante. Longos cochilos, manhãs frias, cheias de lama e com muito vento nos acordaram por dois dias. Campos molhados, devido à tempestade que durou a noite inteira... Muita preguiça. Torcer para o tempo melhorar para poder pegar a bicicleta e sair afora por esses imensos pedaços de terra não-civilizados à procura de algo que nem eu mesma sei o que é. Confuso, eu sei, mas a minha cabeça não tem trabalhado com muito sentido. Amor? Talvez seja o que o meu coração precise. Chove, chove, chove e em um breve cochilo sonho com mamãe e alguns amigos do meu Brasil. Não nomearia “saudade”, pois fazem poucos dias que estou em novas terras, mas sim diria que esses fantasmas vem me acompanhar na tentativa de ocupar o espaço em meu peito causado pela ausência de pessoas a quem se quer muito ao meu lado. Longos minutos, paredes, janela, papel e vazio. Não pude escrever. Talvez fosse melhor voltar à Londres. Falo em vários tempos. Leio Fernanda Takai em seus contos e crônicas que ganhei de meus pais, mas infelizmente - em minha opinião - ela não é uma boa escritora. Quem sou eu para julgar algum escrevedor? Não foi uma boa companheira, mas ainda tenho paixão por sua interpretação. Domingo, comi um delicioso pão com manteiga e bacon pela manhã e voltei para a parte de baixo do beliche. A chuva passou, fez frio e poderia chover a qualquer instante. Penso um pouco nos domingos de casa, café em família, faxina em família, almoço na casa da vó Nice com suas comidinhas maravilhosas, cochilo, cinema e no final a fiel pizza com infinitos diálogos aleatórios. Velejei, andei em praias de pedras e lama e enfim, voltamos.

Uma observação final: Só percebemos o quanto amamos a nossa nação quando estamos longe dela. Pode soar desusado, mas é o que acontece – ou pelo menos aconteceu com a minha identidade.

Meu português está fraco, preciso ler mais.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

A inquietação corre em meu corpo como o coração de brasileiro em baile de carnaval e minhas pernas dançam em um movimento involuntário contínuo. Não tenho medo, mas a única coisa que tem ocupado meus pensamentos é esta partida. As olimpíadas rolando aqui atrás, uma pilha de coisas para resolver e um início de dor de garganta. Vou voltar ao Érico de toda noite, vos deixo com o Vininha – de todo dia – e com a ilustração de Norfolk, meu destino em nove dias.

“Na árvore em frente
Eu
terei mandado instalar um alto-falante com que os passarinhos
Amplifiquem seus alegres cantos para o teu lânguido despertar.
Acordarás feliz sob o lençol de linho antigo
Com um raio de sol a brincar no talvegue de teus seios
E me darás a boca em flor; minhas mãos amantes
Te buscarão longamente e tu virás de longe, amiga
Do fundo do teu ser de sono e plumas
Para me receber; nossa fruição
Será serena e tarda, repousarei em ti
Como
o homem sobre o seu túmulo, pois nada
Haverá fora de nós. Nosso amor será simples e sem tempo.
Depois saudaremos a claridade. Tu dirás
Bom dia ao teto que nos abriga
E ao espelho que recolhe a tua rápida nudez.
Em seguida teremos fome: haverá chá-da-índia
Para matar a nossa sede e mel
Para adoçar o nosso pão. Satisfeitos, ficaremos
Como dois irmãos que se amam além do sangue
E fumaremos juntos o nosso primeiro cigarro matutino.
Só então nos separaremos. Tu me perguntarás
E eu te responderei, a olhar com ternura as minhas pernas
Que o amor pacificou, lembrando-me que elas andaram muitas léguas de mulher
Até te descobrir. Pensarei que tu és a flor extrema
Dessa desesperada minha busca; que em ti
Fez-se
a unidade. De repente, ficarei triste
E solitário como um homem, vagamente atento
Aos ruídos longínquos da cidade, enquanto te atarefas absurda
No teu cotidiano, perdida, ah tão perdida
De mim. Sentirei alguma coisa que se fecha no meu peito
Como pesada porta. Terei ciúme
Da luz que te configura e de ti mesma
Que te deixas viver, quando deveras
Seguir comigo como a jovem árvore na corrente de um rio
Em demanda do abismo. Vem-me a angústia
Do limite que nos antagoniza. Vejo a redoma de ar
Que te circunda – o espaço
Que separa os nossos tempos. Tua forma
É outra: bela demais, talvez, para poder
Ser totalmente minha. Tua respiração
Obedece a um ritmo diverso. Tu és mulher.
Tu tens seios, lágrimas e pétalas. À tua volta
O ar se faz aroma. Fora de mim
És pura imagem; em mim
És como um pássaro que eu subjugo, como um pão
Que eu mastigo, como uma secreta fonte entreaberta
Em que bebo, como um resto de nuvem
Sobre que me repouso. Mas nada
Consegue arrancar-te à tua obstinação
Em ser, fora de mim – e eu sofro, amada
De não me seres mais. Mas tudo é nada.
Olho de súbito tua face, onde há gravada
Toda a história da vida, teu corpo
Rompendo em flores, teu ventre
Fértil. Move-te
Uma infinita paciência. Na concha do teu sexo
Estou eu, meus poemas, minhas dores
Minhas ressurreições. Teus seios
São cântaros de leite com que matas
A fome universal. És mulher
Como folha, como flor e como fruto
E eu sou apenas só. Escravizado em ti
Despeço-me
de mim, sigo caminhando à tua grande
Pequenina sombra. Vou ver-te tomar banho
Lavar de ti o que restou do nosso amor
Enquanto busco em minha mente algo que te dizer
De estupefaciente. Mas tudo é nada.
São teus gestos que falam, a contração
Dos lábios de maneira a esticar melhor a pele
Para passar o creme, a boca
Levemente entreaberta com que mistificar melhor a eterna imagem
No eterno espelho. E então, desesperado
Parto de ti, sou caçador de tigres em Bengala
Alpinista
no Tibet, monje em Cintra, espeleólogo
Na Patagônia. Passo três meses
Numa jangada em pleno oceano para
Provar a origem polinésica dos maias. Alimento-me
De plancto, converso com as gaivotas, deito ao mar poesia engarrafada, acabo
Naufragando nas costas de Antofagasta. Time, Life e Paris-Match
Dedicam-me enormes reportagens. Fazem-me
O "Homem do Ano" e candidato certo ao Prêmio Nobel.
Mas eis comes um pêssego. Teu lábio
Inferior dobra-se sob a polpa, o suco
Escorre pelo teu queixo, cai uma gota no teu seio
E tu te ris. Teu riso
Desagrega os átomos. O espelho pulveriza-se, funde-se o cano de descarga
Quantidades insuspeitadas de estrôncio-90
Acumulam-se nas camadas superiores do banheiro
Só os genes de meus tataranetos poderão dar prova cabal de tua imensa
Radioatividade. Tu te ris, amiga
E me beijas sabendo a pêssego. E eu te amo
De morrer. Interiormente
Procuro afastar meus receios: "Não, ela me ama..."
Digo-me, para me convencer, enquanto sinto
Teus seios despontarem em minhas rnãos
E se crisparem tuas nádegas. Queres ficar grávida
Imediatamente. Há em ti um desejo súbito de alcachofras. Desejarias
Fazer o parto-sem-dor à luz da teoria dos reflexos condicionados
De Pavlov. Depois, sorrindo
Silencias. Odeio o teu silêncio
Que não me pertence, que não é
De ninguém: teu silêncio
Povoado de memórias. Esbofeteio-te
E vou correndo cortar o pulso com gilete-azul; meu sangue
Flui como um pedido de perdão. Abres tua caixa de costura
E coses com linha amarela o meu pulso abandonado, que é para
Combinar bem as cores; em seguida
Fazes-me
sugar tua carótida, numa longa, lenta
Transfusão. Eu convalescente
Começas a sair: foste ao cabeleireiro. Perscruto em tua face. Sinto-me
Traído, delinqüescente, em ponto de lágrimas. Mas te aproximas
Só com o casaco do pijama e pousas
Minha mão na tua perna. E então eu canto:
Tu és a mulher amada: destrói-me! Tua beleza
Corrói minha carne como um ácido! Teu signo
É o da destruição! Nada resta
Depois de ti senão ruínas! Tu és o sentimento
De todo o meu inútil, a causa
De minha intolerável permanência! Tu és
Uma contrafação da aurora! Amor, amada
Abençoada sejas: tu e a tua
Impassibilidade. Abençoada sejas
Tu que crias a vertigem na calma, a calma
No seio da paixão. Bendita sejas
Tu que deixas o homem nu diante de si mesmo, que arrasas
Os alicerces do cotidiano. Mágica é tua face
Dentro da grande treva da existência. Sim, mágica
É a face da que não quer senão o abismo
Do ser amado. Exista ela para desmentir
A falsa mulher, a que se veste de inúteis panos
E inúteis danos. Possa ela, cada dia
Renovar o tempo, transformar
Uma hora num minuto. Seja ela
A que nega toda a vaidade, a que constrói
Todo o silêncio. Caminhe ela
Lado a lado do homem em sua antiga, solitária marcha
Para o desconhecido – esse eterno par
Com que começa e finda o mundo – ela que agora
Longe de mim, perto de mim, vivendo
Da constante presença da minha saudade
É mais do que nunca a minha amada: a minha amada e a minha amiga
A que me cobre de óleos santos e é portadora dos meus cantos
A minha amiga nunca superável
A minha inseparável inimiga.”

domingo, 10 de agosto de 2008

Notinha

Boa noite.
Pode soar desusado dizer que realmente me diverti na noite passada com os meus mesmos amigos de sempre em um lugar onde todas as pessoas se conhecem – menos nós. Cidadãos chistosos, jovens – muitas vezes até mais jovens do que imaginamos – indecisos e com as cabeças mais fechadas desta geração. Juntam-se em bandos, misturam uma tentativa de funk-mal-feito com um hardcore melódico que teve bom êxito à alguns bons anos. Não estou falando mal dos intérpretes, simplesmente acho que faltam boas idéias, boas aulas e uma boa produção. Para completar, no final das apresentações, não se sabe lidar com a situação, pois não é da natureza de quase nenhum presente dançar e todos migram juntos para outro chão sem usufruir um segundo deste. Contudo, foi muito animado desde o início da sobriedade até às falsidades e algumas verdades embriagadas trocadas no fim da noite. Revi pessoas que não são nem nunca serão minhas amigas, mas que mesmo assim deixam saudades de alguns momentos passados juntos. Conheci pessoas, como sempre e essa é a parte mais interessante.

Sentei-me aqui para contar uma longa e incompreendida história, mas acabei me perdendo no tempo, agora minha avó quer dormir e não poderei mais redigir estes pensamentos. De qualquer forma, estou para escrevê-la faz tempo, portanto em breve tentarei empenhar-me nela.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Música ao longe

Meu toca-discos está gracejando com a minha cara e quando eu mais careço de sua companhia ele para de funcionar. Troco então o reggae pelo samba da Marisa – não Maísa – para escrever-te mais uma vez.

Através de Clarissa, criatura de Érico Veríssimo, descobri Paulo Madrigal - poeta até no nome - que disse assim: “O amor que ainda não se definiu é como uma melodia do desenho incerto. Deixa o coração a um tempo alegre e perturbado e tem o encanto fugidio e misteriosos de uma música ao longe...”. E não é que o poetinha entende mesmo do assunto? Para os leigos, o poetinha de Clarissa é outra criação do nosso famoso escritor, já citado.


Mudando de assunto, domingo despertou-me a memória de Joice, minha amiga de outrora que se casou, aprontou as malas e migrou para o sul do país deixando São Paulo com o vazio de sua ausência. Não é hábito citar o nome dos personagens de minha história neste diário – que deveria chamar-se semanário - pois não é de meu agrado esse tipo de asseveração, mas este caso é específico e especial. Meu contentamento é grandioso ao lembrar das maratonas na terra da garoa compostas pela freqüência na faculdade, mesmo que fosse para dormir e recuperar as energias para mais um dia, pelas tardes de atividades complementares em locais como o Museu da Língua Portuguesa e a Pinacoteca do Estado, pelas noites ferventes da capital regadas a cortesias, camarotes, open-bar, fartura de maconha no banheiro, só nossa, e muitas risadas. Sinto-me velha ao lembrar desses dias, pois noto hoje me falta disposição – amigos, dinheiro e tempo talvez. Vale lembrar que não menos especial era ir de encontro com a alvorada no Anhangabaú, comer uma coxinha frita – a mais famosa da cidade – admirando o dia chegando e trazendo com ele a beleza e a loucura do Centro Histórico para depois partirmos de volta para a periferia da Zona Leste, o local mais aconchegante – e distante – que alguém poderia me oferecer para algumas horas de sono no fim da jornada: domingo. Esse pedacinho de texto foi feito como um desabafo, pra te agradecer e dizer que sinto a sua falta Joice, mesmo que você nunca chegue próximo de ler isso tudo.

Nossa... Quase que me esqueço de relatar o que me ocorreu neste mesmo domingo. Pode-se dizer que foi um dia sem-sorte, apenas isso, mas rendeu boas histórias. Fui para a capital de ônibus, peguei o metrô, encontrei uma colega e tomamos outro ônibus – por sorte vazio – sentido Santo Amaro. Para constar: Santo Amaro é Zona Sul, mas é de uma distância da pemba! Descemos na porta da faculdade, local de encontro com outra companheira e estava fechada – que instituição de ensino funciona aos domingos? – é claro. Começou a chover cada vez mais forte. Alteramos com a nossa amiga atrasada para um bar localizado umas dez quadras de onde estávamos, aguardamos ensopadas e enfim fomos rumo ao chá-de-panela. Decidimos comprar alguns pães e bolos para agradar a dona da festa, mas ao chegarmos à padaria começou a sair uma massa de ar quente cinzenta e infinita do carro. O carro tinha menos de um ano, não era dos mais baratos e possuía bancos de couro; Como isso poderia acontecer? Pois aconteceu. Compramos os doces enquanto o motor esfriava. Não era a água, não era a bateria, não era o óleo, não era nada... Era uma simples falta de sorte. O bendito ligou por alguns instantes, mas ao chegar à subida da rua, morreu. Morreu de vez não tendo como satisfeito o fato, desceu de vontade própria até o cruzamento com a avenida. Precisava-mos tirá-lo dali, mas éramos três mulheres em baixo de uma chuva nada católica. Realmente acreditamos que tínhamos a capacidade, mas não foi o bastante. Não apareceu um cidadão solidário nesse meio tempo, então fomos atrás de ajuda. Conseguimos – conseguiram – empurrar o carro de volta ao estacionamento da padaria, mas foi de decisão delas irmos andando ao chá. Era bem próximo e fomos caminhando – continuava chovendo – até que o salto da colega quebrou até que tive de acompanhar e prestar assistência a alguém descalçada descendo a ladeira. Para completar e resumir esta tragédia grega, a sacola de papelão onde estavam armazenados os presentes cedeu e o lindo galheteiro de vidro quebrou-se. Nesta confusão perdeu-se o número do prédio e tivemos que perguntar de porta em porta sobre o tal “bota dentro”. A parte hilária do meu dia terminou por aí, mas a da primeira companheira finalizou-se com o carro do pai quebrado e a da segunda com o seu próprio carro guinchado. O pior é que é tudo verdade.
*Uso muito a palavra “não” em meus textos, preciso ouvir os conselhos de MEU poetinha Vinicius e parar com isso.


Fico por aqui,
Um abraço.

sábado, 2 de agosto de 2008

Desapego

São 00h34, meus olhos pesam e em breve me entregarei ao letargo... As palavras me rodeiam como nunca. Coisa que estou para contar faz tempo é essa história de desapego. Será que alguém no mundo, com exceção dos sagitarianos, realmente tem conhecimento deste assunto? Apegar, segundo o dicionário é: Inclinação; afeição; pertinácia; aferro excessivo. Concordo com o que diz o Sr. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, em quase tudo. Tenho o hábito de ser uma apaixonada e sofrer com os encantos dos mais diversos tipos de pessoas, o que desperta ainda mais o interesse destas. A princípio o mundo é lindo, mas com o acumular das horas, qualquer coisa parece ser mais interessante do que corresponder. Muitas vezes o consciente me faz aceitar algumas situações, como marcar um novo compromisso, pois realmente seria interessante tal diligência. Infelizmente caio na consciência tarde demais e sou obrigada a negar a verdade. Justiça seja feita: sou uma filha da puta – para falar Português claro, como diz a minha mãe. Aonde já se viu? Acredito e é fato que eu caio em amores realmente por aqueles que menos me dão atenção. Aquele tipo que te faz única, mas ao mesmo tempo mantêm a insegurança sempre presente em suas rugas. Faz-se o maior esforço do mundo para gostar do oposto, mas sempre consegue o que quer, quando quer e sem forçar a barra. Não significa dizer que a carência não me acompanhe, pelo contrário, ela está sempre presente, talvez seja preciso mais amizade. Eu havia escrito mais umas seis ou sete linhas sobre o assunto e essas foram levadas por uma ausência de energia aqui em casa, o que me provocou uma ausência de memória e uma preguiça imensa, pois escrever é escrever, de uma só vez. Escrever uma segunda vez não teria a mesma intensidade.

Ontem fui pra casa cedo e sóbria, refletindo sobre dois novos amigos que em menos de dois meses de convivência já são capazes de despertar saudades maiores do que a que sentirei de muitos antigos amigos. Minha menina, hoje já não é mais minha, ou talvez nunca tenha sido – apenas dona dos meus pensamentos – me arranca uma afinidade sem fim, com direito à sambinhas e pensamentos simultâneos. O mesmo acontece com seu já citado amigo gay, que um dia tornar-se-ia meu amigo. Não demorou muito para o seu setentismo me aliciar... Se eu digo “vem?”, a resposta é sempre “vamos!”.

Decidi organizar meus discos, encontrei clássicos da música brasileira e outros descartáveis, que preciso ganhar tempo de trocar. Entre os bons, os mais queridos foram: “Avanço” do Tamba Trio, “Dois na bossa” de Elis e Jair Rodrigues e uma coletânea que pertenceu ao meu bisavô com dez discos com o melhor da música popular da época em um box clássico.

Despeço-me novamente, desta vez como Machado de Assis, caro leitor. Sem revisar. É tarde... Hora de um copo d’agua gelado e um agradecimento por mais este dia. Cheguei ao letargo. Boa noite!

31/07

Peço desculpas pelo descuido da ausência de dissertar por estas bandas, mas estive distante do mundo real. Hospedei-me por alguns dias em beira-mar com mais alguns aliados, pouco sol, pouco alimento, pouco ouro e muito verde. Dias de indolência sem fim regados à brisas e muitos risos. Descobri que perdi algum tempo tendo apenas feito aulas de bateria, sem praticar com uma banda, o que é uma pena, mas ainda não está tudo perdido – prometo dedicar-me.

A tarde não era das mais quentes para mergulhar, mas era perfeita para um passeio nas pedras da orla até à vista que recompensaria todo o trabalho de estar lá. Chegamos com dificuldade, mas o namoro do mar com as pedras formava a espuma que ia e vinha banhando cada espaço vago, trazendo aquela paz imensa à nossos pensamentos. Com a ajuda da querida folhinha, completou-se o plano perfeito e durante alguns bons minutos não éramos mais cinco simples pessoas, mas sim o incalculável entre nuvens, em universos particulares, fora dos corpos e das coisas materiais. Éramos apenas vento e oceano. Ai, se tivéssemos o poder de eternizar esta sensação, entregaria em papel de embrulho com uma dedicatória às pessoas que mantém vivo qualquer tipo de desamor. Seria bom.

Se já não bastasse voltar após o planejado, recebi a informação de que o meu caro amigo cearense já estava a caminho de Santos e aguardava pela minha presença. Pousei na terrinha e fui às pressas ao encontro do mesmo, sem enxergar nada pela frente. Confesso que poderia passar a seu lado outras inacabáveis dezenove horas, apenas ouvindo aquele sotaque gostoso e aprendendo a enxergar beleza nas mais terríveis e pequenas coisas desta vida. Só para constar, contentei-me ao ver meus amigos quebrando o pré-conceito e contagiando-se com essa figura acolhedora.

Meu dedo indicador da mão esquerda tem um resquício de bolha, próximo à palma e outro bem à ponta, ambos gratos à música. Santa! Estou sendo chata?

Minha amada mãe de santo fez aniversário este sábado. Fizemos uma festança surpresa com o tema “anos 60”. Não foi exatamente fiel à temática, mas a intenção é o mais importante... E todos se divertiram. Quase sem dar tempo de chegar a nova aurora, já me mandei para o outro lado do oceano para despedir-me de mais uma companheira. Esta vai para a terra do Tio Sam, lugar que pouco me interessa neste momento, mas fui desejar-lhe boa-sorte, mostrar diligência e comer feijoada até sair rolando. Acabei não rolando e corri, atrasada como sempre, para o encontro dos companheiros de roquenrrol. Passamos bons bocados no condomínio high society. Basta.

PARA TUDO. Tenho uma enorme necessidade de escrever. Beatles, Dylan, Marisa, Martinho, Johnny, Hermanos, Chopin e tudo que gira em torno impulsiona essa vontade... Sinto certa dificuldade. Suspeito de algumas razões, mas sinto que preciso voltar a estar comigo, só comigo. Faltam apenas duas semanas para a minha partida, estou querendo colocar trezentosesessentaecincodias em quinze. Não pode! Não pode! Preciso encontrar-me novamente.

Preciso escrever sobre a mania de fugir das pessoas, mamografia e sobre as interpretações errôneas destes textos, mas agora além da dificuldade que eu já encontrava, minha irmã ligou na Globo, onde passa “A Grande Família”, o que fechou com chave de ouro esta prosa de não-pensamentos.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Breve

A alvorada já fez nascer uma nova segunda-feira ensolarada e o tempo parece correr cada dia mais depressa. Esta noite sonhei que despertava e já era dia de partir, mas eu não estava preparada. Estou preparada! Acho que ainda não caí em consciência de que daqui a vinte e sete dias depararei com uma nova alvorada cotidiana, sem Cartola, sem bananas e sem calor. Mesmo assim, sinto-me preparada. Será boníssimo, tenho certeza! Desejo com ardor para que essa experiência de nova vida chegue logo. O único e maior receio é não mais ter a alegria de abraçar meus avós em um absorto retorno. Por isso, ganharei muito ouro e os levarei para perto de mim. Então desperto.

domingo, 20 de julho de 2008

Seus pés não têm culpa

Nunca deixe o aconchego do lar para aventurar-se no infinito de uma noitada. Não deixe que a dó refletida no fascínio do próximo, por qualquer vontade do mesmo, o faça persistir em bandear contra sua própria natureza. Não escolha um sapato desconfortável, seus pés na tem culpa de nada. Nunca use, principalmente à noite, vestimentas hodiernas que não estão adequadas à opinião da maior parte da população, mesmo que você não se importe com o que ela pensa, pois após uma madrugada em claro, vem a aurora onde os gatos já não são tão pardos como antes.
Não tagarele no transporte público, onde trabalhadores cotidianos podem estar simplesmente desejando alguns instantes de paz na jornada para casa. Nunca, mas nunca projete nada que exija disposição extra com mais de dois camaradas fiéis nesta tarefa, pois isso será de certo um atraso para todas as decisões futuras. Seja cauteloso ao andar nas ruas após um determinado horário, mas não tenha medo, pois com a vela acesa, papai Ogum, mamãe Iansã e todas as correntes estarão zelando por sua segurança e para que tomes o melhor rumo. Não tente forçar o carinho de quem está dando a mínima para você, apenas mantenha-se educado da forma com que seus avós ensinaram seus pais. Não renda-se: Não seja como aqueles outros! Aproveite sempre os primeiros momentos, pista vazia e as mentes ainda sóbrias, sem festivais de ego, apenas na busca da descarga de energias pesadas através de músicas extremamente dançantes. Nunca misture cerveja barata com espumantes, destilados e maconha. Não fume! Não fume que faz um mal danado para você, para quem está em volta, para a sua imagem e principalmente para o seu hálito. Nunca dê ouvidos a um pseudo-homem tarado disfarçado em bom moço culturalmente completo e sensível. Não deixe a brisa pegar, pois após o filme começar a rodar em câmera lenta em preto e branco, não tem mais volta. Nunca dê tanta atenção a uma companheira que fica de porre, senão ela nunca irá aprender – isso não quer dizer abandonar. Dê menos atenção ainda para a outra amiga de tempos julga teus atos infantis. Não permaneça contra a sua vontade. Nunca suba a Avenida Brigadeiro sem sapatos, você pode pegar leptospirose. Não pernoite na casa de pessoas que moram em bandos e dormem em colchões no chão, te oferecem coxinhas fritas fresquinhas do boteco mais próximo e te hospedam de braços abertos como se você fosse um amigo da boa e distante infância. Não se encante pelo charme da amiga, também hospedada e muito menos por um residente. Não estranhe deparar com típicos bichos-grilo adormecidos na sala de estar do abrigo, afinal, você também é um deles. Nunca saia sem despedir-se no anfitrião e retribuir a gentileza. Não esconda dinheiro em lugares olvidáveis. Nunca se arrependa da madrugada anterior, o mundo é muito maior que tudo isso... E lembre-se novamente: Nunca, jamais e em hipótese alguma use um calçado desconfortável, isso causará ardência, inchaço e febre local por mais de 24 horas.

sábado, 19 de julho de 2008

SEXTA-FEIRA, 18.07.2008

Ao som de “Be my life’s companion” flutuo entre dezenas de cédulas de cinqüenta reais, que em breve tornar-se-ão aquelas notinhas valiosas com a face da rainha estampada em cada uma delas. Alegremente saltitante vejo o objetivo aproximar-se cada vez mais e acariciar minha alma com aquele calafrio cortante e delicioso da ansiedade. Seria embaraçoso, gritar, por isso chacoalho as pernas e braços de forma com que este movimento transforme cada membro de meu corpo em um metal. Isso também é embaraçoso, mas de que me importa agora? Salve o piano de Billy Kyle! Salve o contrabaixo de Mr. Shaw! Salve Danny Barcelona na bateria! Salve Joe e o seu clarinete! Salve the Big Chief Russel Moore e seu trombone! Salve as suaves cordas do banjo e do violão de Glen Thompson!

As energias da natureza me recompuseram ontem, até esqueci de citar. Nada neste século poderia amparar melhor a aurora de uma quinta-feira ardente do que namorar o encontro do céu e do mar da formosa praia do Tombo. Saciar a fome com filé de peixe ao molho de camarão feito na hora, mergulhar em “Para viver um grande amor” pela centésima vez e brindar o início da tarde com uma cocada das boas, junto a uma grande parceira e também a minha caçula e única irmã, Amanda.

Deixarei-vos na solitude desta breve e amigável prosa, para que eu possa enfrentar o dilema, célebre pelo sambinha – Ary Barroso que me perdoe o polêmico termo - de Noel Rosa, da escolha da roupa perfeita para encarar novamente a metrópole no dia de amanhã.

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Blue Moon

Pode soar poético e exagerado, mas esta lua de hoje não está para brincadeira.

Ficaria horas aqui neste quartinho desaconchegante só observando-a, refletindo nos cantos mais escuros desta noite iluminada.




O dia de hoje foi longo, mas teve aconchego, novas aquisições, mais um Louis Armstrong para a coleção e a companhia do novo amigo que ganhei, após algumas madrugadas e tardes culturais - não tão católicas.

Agora voltarei para preparar um suco de limão, meu favorito e admirar a lua ao lado de minha mãe, pois tenho pouco tempo para aproveitar disso tudo.
Ps. Mandei alguém olhar a lua antes de dormir, porque ela está incrivelmente especial hoje e recebi como resposta: "e ver você nela".
Lindo! Acho que o mundo precisa um pouco mais disso.


Até.

Está decidido e assim será:

"...dorme, que assim
dormirás um dia
na minha poesia
de um sono sem fim..."

domingo, 13 de julho de 2008

Inglaterra, afinidades e os astros.

Boa noite.

Pensei em escrever nos últimos dias, mas não me senti inspirada para tal. Por uma incrível coincidência, estou ouvindo novamente o mesmo Dylan de dia desses, mas não me canso. Pelo contrário, arde, arde que me faz bem. Acho que é assim com todos que têm coisas favoritas. Eu tenho coisas favoritas.

Tenho encontrado com uma razoável freqüência os mesmos rostos para beber alguma coisa e jogar conversas aleatórias ao vento. Hoje não tive esta vontade. Não significa que esse desejo sempre corroa as minhas escolhas, mas eu simplesmente tenho optado por esse experimento. Foi dia de acordar tarde, mesmo adormecendo cedo na noite anterior, encher o bucho de macarrão e assistir Faustão. Na realidade crua não cheguei próximo de sintonizar no simpático gordinho, foi só para dar o desfeche do pensamento.

Essa história de ficar em casa sempre nos deixa mais preguiçosos do que nunca. Comecei até a dar mais atenção para Camões. Pouca atenção, pois a preguiça bate sempre. Entardece neste quarto e o ruído gostoso do toca-discos tira a minha atenção, como sempre. Recebi notícias da futura família, do outro lado do oceano, restavam dúvidas, mas está a minha espera. A hospitalidade britânica não carrega boas referencias, mas com toda a certeza serei bem-vinda. Sinto. Acredito nos meus guias também, que acompanham meus caminhos e afastam todas as preocupações de meus pensamentos ansiosos. Fiz uma lista dos humanos próximos que virão despedir-se daqui a um mês. Um mês! Está mais próximo do que imaginamos. Escova de dentes nova, quarto novo, banheiro novo, espelho novo, roommates novos, rotina nova, amigos novos, solidão nova, cultura nova etc. Excitante, não? O Reino-Unido está violento e cada vez mais sem-educação, por isso agradeço todos os dias por ter sido concebida por esta nação mãe que é o Brasil e ter chance de conhecer e aprender com o berço do mundo: Europa. Quero ver flores no amanhecer cinza refletindo na arquitetura centenária da capital Inglesa, ler livros e virar um dinossauro sabe-tudo neste grande mundo. Viajar, viajar, viajar. Um abraço pra quem fica.

Preciso citar um fato ocorrido esta semana, que a princípio ocupou as minhas preocupações, mas hoje considero simplesmente uma dúvida confusa esquecida no meu bolso. A minha maneira de falar é compreensível? Como não fazia há tempos, abusei do interesse machista – e cavalheiro, claro – de um antigo amigo colorido de levar-me em carona para um jogo rápido de palavras. Foi realmente o que aconteceu: Uma troca de risadas sem motivo, resgate de assuntos, nomes já não citados pra lá de um ano e um carinho disfarçado de piadas. Após deixá-lo no “obrigada” - beijo no rosto – caí no esquecimento e mergulhei na madrugada em outros assuntos, outras pessoas, outras luas. Quase amanhecendo, de quem lembrar? Dele mesmo, que voltou generoso ao local combinado, para que com seu gesto de cavalheirismo terminasse a noite bem. Deixou todos em casa e na minha vez, sem nenhum trocar de palavras ou insinuações, beijou-me como se eu fosse a ultima entre as mulheres. No momento realmente era. Agora direi o que eu mais precisava: não senti nada. Foi interessantíssimo, o rapaz é incrível e temos todas as afinidades do mundo. Talvez não todas, mas muitas. Ele é um dos mais desejados e descolados caras desta minúscula cidade. O tocar de lábios e a dança das línguas foi sutilmente agradável, a troca de energias delicada e poderia soar a voz doce da Regina Spektor nos meus ouvidos ao decorrer daqueles trinta minutos, mas nada aconteceu. Nadinha de nada. Saí de lá com a maior interrogação de todos os tempos na cabeça, perguntando a mim mesma o que estaria acontecendo. Prefiro tentar não entender. Como disse uma conselheira, espero: Deve ser uma fase.


Sagitário: Você está mais caseira e intimista. A combinação de planetas no céu favorece atividades como escrever e desenhar. Use sua criatividade para fazer um blog, expressando sua forma de ver o mundo, suas angústias e seus sonhos. Dica: reflita um pouco sobre seus valores. Procure observar as pessoas que você admira.

Acabei de achar esta citação, na revista adolescente da irmã mais nova que estava entreaberta sob a mesa. Parece que estou seguindo direitinho as “dicas”. O amigo colorido faz mapa astral! Descobri hoje que o Balzaquiano também está por dentro da linguagem dos astros e justifica muitas decisões com argumentos deste segmento. Acho interessante. Gosto desse tipo hippie. Queria ser hippie – mentira.

Basta.

sábado, 12 de julho de 2008

Resíduo

De tudo ficou um pouco
Do meu medo. Do teu asco.
Dos gritos gagos. Da rosa
ficou um pouco

Ficou um pouco de luz
captada no chapéu.
Nos olhos do rufião
de ternura ficou um pouco
(muito pouco).

Pouco ficou deste pó
de que teu branco sapato
se cobriu. Ficaram poucas
roupas, poucos véus rotos
pouco, pouco, muito pouco.

Mas de tudo fica um pouco.
Da ponte bombardeada,
de duas folhas de grama,
do maço
- vazio - de cigarros, ficou um pouco.

Pois de tudo fica um pouco.
Fica um pouco de teu queixo
no queixo de tua filha.
De teu áspero silêncio
um pouco ficou, um pouco
nos muros zangados,
nas folhas, mudas, que sobem.

Ficou um pouco de tudo
no pires de porcelana,
dragão partido, flor branca,
ficou um pouco
de ruga na vossa testa,
retrato.

Se de tudo fica um pouco,
mas por que não ficaria
um pouco de mim? no trem
que leva ao norte, no barco,
nos anúncios de jornal,
um pouco de mim em Londres,
um pouco de mim algures?
na consoante?
no poço?

Um pouco fica oscilando
na embocadura dos rios
e os peixes não o evitam,
um pouco: não está nos livros.

De tudo fica um pouco.
Não muito: de uma torneira
pinga esta gota absurda,
meio sal e meio álcool,
salta esta perna de rã,
este vidro de relógio
partido em mil esperanças,
este pescoço de cisne,
este segredo infantil...
De tudo ficou um pouco:
de mim; de ti; de Abelardo.
Cabelo na minha manga,
de tudo ficou um pouco;
vento nas orelhas minhas,
simplório arroto, gemido
de víscera inconformada,
e minúsculos artefatos:
campânula, alvéolo, cápsula
de revólver... de aspirina.
De tudo ficou um pouco.

E de tudo fica um pouco.
Oh abre os vidros de loção
e abafa
o insuportável mau cheiro da memória.

Mas de tudo, terrível, fica um pouco,
e sob as ondas ritmadas
e sob as nuvens e os ventos
e sob as pontes e sob os túneis
e sob as labaredas e sob o sarcasmo
e sob a gosma e sob o vômito
e sob o soluço, o cárcere, o esquecido
e sob os espetáculos e sob a morte escarlate
e sob as bibliotecas, os asilos, as igrejas triunfantes
e sob tu mesmo e sob teus pés já duros
e sob os gonzos da família e da classe,
fica sempre um pouco de tudo.
Às vezes um botão. Às vezes um rato.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Vou pra Long Beach...

Bom dia, dia.

Me encanta mucho essas manhãs frias e ensolaradas que têm me acordado todos os dias. A irmã está na cozinha preparando de boa vontade algo simples para nos fazer aguentar a batalha diária, mamãe está aproveitando seus ultimos dias de férias e estou aqui novamente, onde deveria estar praticando os ultimos exercícios das aulas de bateria.

Refleti pouco este começo de dia. Sorte a minha que ninguém nesse mundo tem interesse em desvendar minhas entrelinhas citadas aqui, assim sinto-me mais a vontade para dita-las com mais profundidade.

Algumas pessoas aparecem na sua vida, ficam nela por meses - muitas vezes até anos - e criamos um carinho imenso por estas, mesmo tendo as encontrado pessoalmente pouquíssimas vezes. É o caso de alguns que considero bem próximos e tenho saudades. Preciso reencontra-los antes de partir.


Vou lá pro lado da família em Long Beach agora. Fazer um programa tipicamente caseiro e gostoso ao lado de gente querida, sair rolando e vendendo felicidade. Volto logo!

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Mr. Tambourine Man


Hey Mr. Tambourine Man, meu toca discos está cansado e deixa o Dylan de 75 similar ao de 2007, mas mesmo assim o meu amor por ambos continua o mesmo. Neste exato momento toca a minha canção. A melhor de todas do mundo inteiro e eu paro, como sempre. I’m not the one you want babe, I’ ll only let you down. Fui engolida pela metrópole na madrugada de hoje, tenho muita preguiça. Não houve sintoma de bebedeira, mas as evidências estão no cansaço físico e nas marcar de bituca de cigarro cravadas por diversas partes dos corpos. Minha cabeça dói constantemente, repito que não como um porre, mas sim por ficar por horas e horas em frente a esse veneno, que me consome e te consome.


Todos estavam montados de maneira que fizesse parecer que não são iguais aos outros e não são influenciados por uma tendência passageira, mas no fundo bem lá no fundo o que todos queriam é parecer uns com os outros e enlouquecer noite a fora. Um não se sabe se é amigo, pois usa uma máscara noventaporcento do tempo, mas tem conhecimento íntimo de alguns anos. Outra é a menina dos olhos, linda como nunca, distante como sempre, acompanhada do amigo gay que faz o tipo simpático e tenho certeza que em mais algumas madrugadas em claro tornar-se-ia um grande amigo meu. How does it feel? Falam mal de personagens de conhecimento comum, de relações amorosas e tornam a falar mal de outros ou mesmos personagens do cotidiano. Chegam ao local planejado, sentem-se estranhos ao comparar-se com as outras pessoas normais, não montadas, voltando para casa em sua rotina, mas crescem o peito para ter a certeza de que o mundo é que está errado.



Para esquecer dos problemas, que talvez não sejam tantos, para ficar mais extrovertidos ou simplesmente por prazer, degustam longas latas de cerveja clara, não tão geladas, em combinação com chicletes sem açúcar. Juntam-se com os novos amigos dos outros não tão novos amigos, separam-se em duplas ou trios e seguem rumo ao caldeirão. O cansaço bate, mas não pode passar das paredes da minha individualidade, senão todo o esforço estará perdido.




Esqueci de citar que ao juntarem-se com os novos amigos dos outros não tão novos amigos, existe o abraço apertado na amiga não tão nova, que não via pra lá de um semestre. Gera uma ponta de ciúme nos outros companheiros e principalmente na menina dos olhos, que ao mesmo tempo cria uma admiração instantânea pela mesma.




I want you. I want you. I want you so bad. Honey, I want you.



No meio do durante, onde toda a ferveção aconteceu, vários reencontros esperados, mas talvez não tão desejados, vão surgindo entre a luz negra e o erro na mudança da música. Pessoas medíocres com quem eu não tenho nenhuma afinidade, trazem a falsidade junto com o lenço colorido no pescoço e fingem realmente importar-se com o que você tem feito, ou o que fará nos próximos meses, para ser motivo de uma conversa hipócrita alguns segundos depois, pois ninguém é bom o suficiente como eles para mudar para o antigo continente, estudar artes ou qualquer coisa que signifique passar por cima desse complô. She thinks just like a woman, but she breaks like a little girl. A minha menina continuou sóbria e discreta, mas já se mostrava mais próxima de mim.



Cervejas, cervejas, cervejas compradas, cervejas roubadas, caipirinhas de todos os sabores roubadas, rodas de dança, dança singular, dança tosca e sensual tão igual, mas tão individual ao mesmo tempo. Perde-se o controle, o juízo e tudo que poderia ser certo naquele momento. Todos deixam cair às máscaras aos poucos, revelando lentamente as verdades e os desejos de cada um. Os hormônios estão alterados, as idéias estão confusas, mas tudo parece simples: amor livre, amor para todos, amor. The answer, my friend, is blowin’ in the wind. Todos beijam-se. Amigos, novos amigos, desconhecidos, pessoas não-queridas, todos beijam-se no decorrer da noite. A noção já foi embora junto com a sobriedade, verdades são ditas, cigarros são acesos atrás de cigarros e o cansaço não nos pode deixar abater. Minha menina já virou menina de outra moça, eu virei menina de outro rapaz, outra moça, outro rapaz, outra moça e por aí segue até amanhecer. Dói um pouco, mas bem pouco. Ir ao banheiro a cada instante só para olhar se ela continua lá, olhar-se no espelho e sentir-se deslumbrante, mesmo suada – e também descarregar a cerveja. Não conheço metade das canções que todos sabem, já falei verdades para pessoas indevidas e não agüento o peso das minhas próprias pernas.




Morro. Num sono profundo de loucura, tão profundo que é quase impossível despertar. Já amanheceu o dia, está lindo e frio, mas a minha memória só me faz lembrar os fatos da noite passada. A princípio uma vergonha, mas agora já soa natural.




Agora meus olhos estão pregados, não fui assistir ao filme do Woody Allen como havia planejado. Uma preguiça imensa tomou conta do meu corpo. Comeria uma pizza e ouviria mais umas cinqüenta vezes esse disco, que agora já pegou velocidade suficiente para que Bob Dylan’s Greatest Hits vol.I seja exatamente como ele é.